domingo, 6 de março de 2011

o amor é maior que a morte

"Aqui é festa, amor/ E há tristeza em minha vida." Esses versos, desabafados por Otto, carregam doses cavalares de sofrimento, de conflito, em um disco que serve como reflexão sobre a vida e, conseqüentemente, sobre a perda. Viver é perder. É se perder. Todo momento. Quero, hoje, falar sobre a vida. Eis uma missão que sei, de antemão, impossível em sua totalidade. Porém me lanço nesse desafio, de tecer tais impressões, pois semana passada estive em um velório inesperado – da mãe de um grande amigo meu. Inesperado, pois ela foi vítima de um atropelamento na Avenida Goiás. Eu poderia escrever sobre o trânsito violento de Goiânia como causa de mortes absurdas; mas deixo esse tema de lado, por ora. Prefiro falar da vida e sua beleza e suas rasteiras. Uns festejam a vida e outros choram. Neste feriado de carnaval, enquanto o Brasil festeja, tenho um amigo em luto. Fico triste ao vê-lo triste. Triste ao ver-me impotente em um momento sem palavra que preencha o vazio. Triste ao lembrar. Lembro.

Todo velório é sempre um momento para pensar na vida. É na vida que todos pensamos diante de um caixão. Na despedida, não pensamos no ente querido enquanto matéria, mas enquanto memória viva. Viver é perder? Não. Viver é ganhar. Ganhar, dia a dia, em experiência, em sabedoria, com as próprias perdas. Todo velório é sempre um momento para pensar nessa reviravolta que a vida é, com seus imprevistos – alguns agradáveis, outros desesperadores. Minha mãe diz: “para morrer, basta estar vivo”. E nós, aqui, nessa corda bamba que é o mundo dos vivos, vemos um filme passando em nossas mentes. Fico triste ao lembrar. Também sorrio ao lembrar de detalhes, de pequenas situações vivenciadas. E lembro-me de outros velórios. Cada um carrega dentro de si o seu velório fundamental (aquele que constitui a pessoa, aquele que faz parte do seu repertório de experiências). O meu, por exemplo, é o do meu pai. Aonde vou levo o velório do meu pai comigo. Meu pai foi, mas deixou uma lembrança maior, de amor. Lembrei-me dele, quinta passada, quando caminhávamos para o jazigo e algumas pessoas cantavam baixinho uma linda melodia:

“O amor é maior que a morte”.

O amor é a mensagem que a Flávia (mãe do meu amigo, e companheiro no mundo da música, Gabriel Cruz) nos deixa. Mensagem transmitida por suas atitudes de mãe que lutava com garra por seus filhos, que irradiava luz, que tinha uma palavra de incentivo para aqueles que brigam por seus sonhos. Viver é ganhar, é vencer. O vencedor é aquele que “vence a dor”. Paulo está certo: “quando estou fraco é que sou forte”. Eu sou “nuvem passageira”, mas fica a lembrança, a mensagem de luta. Sei que sou um “ser para a morte” e, justamente, por saber que “o amanhã, na verdade, não há”... faço-me “ser para a vida”... “só nos resta viver”. Viver e perder e ganhar e gastar e grilar e amar. E odiar também, pois, não sei quem disse, o contrário do amor não é o ódio, é a indiferença. Então, sem meio termo, acima de tudo: amar. Não interessa se sou ateu ou religioso, o que importa é a minha capacidade de amar. “O amor, maior que a morte.”

[publicado no jornal Diário da Manhã]

3 comentários:

PÓ DE SER disse...

Dieguito, um abraço no Gabiras por mim e VIDA longa ao sindicato, a reflexao sobre a morte estar por perto, nos rondando, nos faz querer viver melhor, fazer coisas relevantes, estar com pessoas que nos fazem bem, em paz com o mundo e consigo. Mexeu muito comigo aqui.

EuMesma disse...

Excelente reflexão. Sempre teorizo sobre a morte e a vida. O amor pelas pessoas e os ensinamentos que elas deixam. Qual a memória que terão de você? E de mim?
Você faz o que para deixar sua marca no coração do mundo??
O que você faz pra viver a vida loucamente, divinamente, intensamente e sempre como se fosse seu último momento??
Valorizar as pessoas enquanto ainda estão conosco. Ouvir o som da voz delas enquanto ainda podemos. Saudade dói muito. Mas ter lembranças reaquece o coração.

Giovani Iemini disse...

ainda que a morte seja a única certeza da vida, não nos acostumamos a ela.
força para todos.