domingo, 21 de novembro de 2010

Hoje é dia de ouvir John Lennon!



Me lembrei do exato momento em que eu, no auge dos meus 9 anos, descobri um vinil de uma coletânea de sucessos (o Shafed Fish) do John Lennon, na casa de um tio meu aqui do Canedo. Gravei aquelas músicas em uma fitinha K7 e ficava, durante horas e horas, ouvindo no meu velho radinho de pilha. Ah, aquelas canções que, não sei porque, me emocionavam profundamente, mesmo eu não entendendo nada das letras! Depois, quando eu soube o significado, aquilo fez ainda mais sentido! Me apaixonei primeiro por Lennon e depois por Beatles. “Naquela época” eu não tinha a internet pra garimpar sons, por isso curtia ao limite cada música. Ainda tento, na medida do possível, fazer isso; mas, hoje, na nossa bela época de excessos, é cada vez mais difícil descrever as sensações maravilhosas advindas do meu remoto radinho de pilha, minha ilha imaginário-sonora, uma maravilha. Não quero, porém, ser saudosista (não tem esse papo de “no meu tempo”, pois meu tempo é quando eu estiver vivo), ainda mais ao lembrar de quando a pilha estava para acabar e
a Têtê Espíndola começava a virar Nelson Golçalves...Mas só tô falando do meu velho radinho de pilha pra dizer que, desde “aquela época remota”, me posiciono, na velha questão sobre o “beatle favorito”, na louvação do John Lennon.

Sei que hoje eu deveria falar sobre “Sir McCartney no Brasil”. Mas decidi falar de Lennon, posso? Alguns dos meus amigos hoje, ou amanhã, estarão lá na fila para ver o Sir Paul. Estive a um passo de estar nesse show. Tudo bem, sem ressentimento. Verei o show do conforto da minha sala, comendo pipoca com guaraná. “Ah, mas estar lá será uma experiência mágica, única, na vida, de ver um beatle (ao) vivo”, me cutucam. Me confortarei dizendo para os meus netos que vi os Stones em Copacabana. “Ah... mas os Beatles são maiores os Stones”, me diz um chato de galocha. Ok... Chega! Entendi! Tá bom, sei que vou amargar pelos restos dos meus dias aqui na Terra por não estar lá.

Mas, convenhamos, apesar de achar lindo a multidão sintonizada na idéia de “All you need is love”, sei (aqui na minha realidade concreta e individual, determinada socialmente) que, nesse nosso “mundo imundo”: “All you need is money” (Zappa sempre está certo, meu caro!). Então, mesmo contra a minha vontade mais profunda, preciso manter os pés no chão. Por isso preferi não comprometer financeiramente meu fim de ano com um feitichismo beatlemaníaco. Sem falar que estou em um momento da minha vida em que preciso me concentrar na minha dissertação – e escrever dói. Então, prefiro fazer minha terapia ocupacional, escrevendo nesse espaço minha declaração de amor ao John. Quem sabe assim, eu consiga viver essa semana com mais tranquilidade, diminuir a probabilidade de um câncer, concentrar em minha dissertação e economizar minhas moedinhas – já que sou apenas um “working class crazy”.

Li uma matéria dizendo que Paul cantará “Here Today”, canção de amor ele que fez para John. Além de ser uma homenagem póstuma, é uma trégua nas brigas musicais dos dois gênios. Lembremos que, na época do ressentimento de Lennon, nos anos 70, ele escreveu, para McCartney, na polêmica “How do you sleep?” : “The only thing you done was Yesterday”( A única coisa que você fez foi Yesterday). Tretas,tretas, tretas...

Uma vez uma amiga me deu um cd, com com a discografia do Paul, escrito: “Mais que um inglesinho”. Foi aí que conheci o lindo disco “RAM” , da carreira solo do Sir. Concordo que, tecnicamente, o Paul é melhor, compôs melodias mais sofisticadas, consegue cantar e tocar aquele baixo monstruoso. Mas foi o John que, lançou a frase “The Dream is over”, foi o subversivo pacificista John que “imaginou um mundo sem países e religiões”. John conseguiu, em sua carreira solo, se desvincular esteticamente mais dos Beatles do que o Paul. John assumiu o ofício de ser “o palhaço do mundo” (como ele mesmo disse). E acho que o valor de um artista está mais nas provocações, nas questões que ele lança no ar, do que em suas virtudes técnicas, apenas. Por vários motivos, que não cabem nessa coluna, meu beatle favorito é o John. Por exemplo, quando eu soube a tradução da violenta “Working Class Hero”, deu um nó na minha cabeça e pensei: “É isso! O cara cuspindo no 'sistema', dentro do próprio 'sistema'”. Me arrepia da confessional “Mother” à singela “Love”. É por essas e outras que “sou mais” John. Mas “sou mais” Beatles.

No fundo prefiro Lennon/ McCartney!

publicado no jornal Diário da Manhã

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